Cappuccino - Faroeste Caboclo
Dirigido por René Sampaio
Renato Russo morreu jovem. Para muitos, o rockeiro é apenas
a face do aborrecido rock nacional. Suas letras são, em geral, consideradas
superestimadas, reduzindo-se a poesias com conteúdo raso mascarado de
alta-filosofia. Profundos ou não, não se pode negar que as músicas possuem em sua essência
uma história com início, meio e fim, estrutura perfeita para adaptações
cinematográficas – embora a duração de aproximados cinco minutos dificultar o
processo. Com isso em mente, o diretor René Sampaio se inspira na canção “Faroeste
Caboclo”, música-conto conhecida por sua longa duração e que transformou a
trágica história de João em cultura popular.
Por se tratar de uma história quase que onipresente na
cultura do brasileiro, o longa ganha o privilégio de poder ser econômico. Não
precisamos de sinopses ou resumos para saber do que se trata o filme ou qual
será o fim dos personagens. Entretanto, o conhecimento da história por parte do
espectador pode configurar-se como um problema na medida em que gera
desínteresse. Ora, se já sabemos o que vai acontecer com um personagem, não há
motivos para que nos preocupemos com suas situações de perigo ou drama.
É preciso, portanto, maximizar a vantagem e tentar minimizar a desvantagem, e o longa se sai extremamente bem nisso. Ao apresentar personagens que são carismáticos e tridimensionais, nosso interesse deixa de ser no desfeixo destes, mas em seu desenvolvimento. A ciência que o filme tem de sua onipresença trás consigo outros benefícios. Não vemos – diferentemente do longa “Somos tão Jovens” - diálogos expositivos com frases da letra da música – exceto por uma cena, mas esta é orgânica e justificável - , já que os elementos apresentados são suficientes para nos situar no universo em que a história é contada.
É preciso, portanto, maximizar a vantagem e tentar minimizar a desvantagem, e o longa se sai extremamente bem nisso. Ao apresentar personagens que são carismáticos e tridimensionais, nosso interesse deixa de ser no desfeixo destes, mas em seu desenvolvimento. A ciência que o filme tem de sua onipresença trás consigo outros benefícios. Não vemos – diferentemente do longa “Somos tão Jovens” - diálogos expositivos com frases da letra da música – exceto por uma cena, mas esta é orgânica e justificável - , já que os elementos apresentados são suficientes para nos situar no universo em que a história é contada.
De nada adiantaria a eficiência do roteiro se o elenco não
fosse capaz de representar os famigerados personagens. Todas as atuações são
consistentes e eficazes, com pequeno destaque para Felipe Abib, que transforma
Jeremias em um personagem detestável, e a certeza de que veremos sua morte
prende a atenção e gera um certo alívio. Isis Valverde surge encantadora não só
por sua beleza, mas pela doçura com que vive Maria Lucia, e sua devoção por João
nas situações mais trágicas apertam o coração com intensidade.
E mesmo com essas qualidades, o maior mérito do filme se
encontra na montagem, que se mostra extremamente criativa ao apresentar
raccords gráficos e sonoros belíssimos – a cena em que Pablo vai ensinar João a
atirar já seria genial ao intercalar o João do presente com sua versão infantil
aprendendo a atirar (referência clara aos versos “Mas Pablo trouxe uma
Winchester-22/ E Santo Cristo já sabia atirar), mas o filme vai além e faz com
que a arma permaneça em posição bem próxima nas 2 linhas temporais, suavizando
os cortes e sendo visualmente agradável. As elipses também evitam a exposição
de informações, buscando sempre uma solução criativa – gosto muito daquela em
que o protagonista, ainda criança, vai com a mãe pegar água no poço e, quando o
balde retorna, ele já está mais velho, mostrando que os anos que passaram foram
marcados pela rotina, apenas buscando a sobrevivência.
A montagem não funcionaria, entretanto, se não fosse pelo
fabuloso trabalho da fotografia e do design de produção. Ao definir uma lógica
visual específica para cada linha temporal, o espectador não possui
dificuldades em se situar na lógica do filme, minimizando os riscos de se fazer
saltos temporais sem avisos explícitos. O uso de cores também é cuidadoso – a
falta de vida do cenário e das roupas de João em Santo Cristo retratam com
perfeição a vida sem significado que o protagonista tinha e criam um belo
contraste com as cores fortes de Brasília.
O filme mostra-se, pois, completo e harmonioso devido a
inúmeras decisões bem-sucedidas, como a liberdade de ajustar alguns pontos da
história visando gerar maior tensão e desenvolvimento dos personagens. Embora
eu não goste muito de comentar a reação do público em críticas – análises como
essas são subjetivas e não costumam ser sustentadas com argumentos racionais - ,
me sinto obrigado a chamar atenção para os créditos. Ao introduzir a música que
deu título ao filme nos minutos finais, somos levados a refletir sobre tudo que
acabamos de ver – embora as comparações que faremos inevitavelmente entre a
música e o filme não serem muito saudaveis para a avaliação da obra proposta -,
e é muito bom ver o público que, infelizmente, costuma deixar o cinema ao
primeiro sinal dos créditos ficar até o fim da música e se emocionar ao final.
.png)





0 comentários: